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5/31/2005 

Renata

Dei por mim a lamber-te os olhos como os gatos fazem habitualmente num acto de limpeza puro e desprovido de qualquer sentimento afectivo.
Deitada, esboçavas um sorriso pequeno, daqueles sorrisos satisfeitos que não precisam de enrugar a cara inteira para mostrar satisfação e apreço. Um sorriso sincero, que vejo poucas vezes mas que enche a alma de confiança e paz, que me faz sentir que tenho uma mulher crescida deitada comigo, da qual sinto orgulho.
Após a tarefa concluída, volto-me e deixo caír o corpo pesado sobre a cama, inspirando fundo e fazendo festas nos pêlos do peito. Suór escorre-me da testa e olho o tecto como se um céu estrelado estivesse de frente para mim. No entanto, era apenas um tecto branco com tinta de areia a estalar.
Aninhaste por cima do meu braço direito, colocando a cabeça sobre o meu peito e a perna sobre a minha. A tua mão substitui a minha fazendo festas no peito. Abraço-te fortemente apertando o corpo pequeno contra o meu e suspiramos em conjunto...
Fecho os olhos por segundos e penso: "Não quero mais nada. Sei que não quero mais nada e não tenho paciência para mais nada que isto. Como posso verbalizar?".

Adormecemos.
Acordamos.

Estamos mortos.
Não, não estamos. Mas antes estivessemos tendo em conta a dificuldade que é amar uma pessoa a todos os níveis.
O que está morto é o meu braço debaixo do teu corpo; e assim acordo.

Deito-me.
Adormeces primeiro.

Por vezes deito-me à noite pondo os braços por debaixo da almofada e fico parado a pensar sozinho. Tento arranjar maneiras de me expressar comigo próprio, como se fosse necessário esclarecer o que já sei. Na verdade, tento apenas encontrar formas linguísticas para comunicar com o exterior, é um exercício comigo próprio mas não para mim. Como se estivesse a virar a roupa do avesso para alguém que não sabe que a roupa tem tecido de ambos os lados.
E o corpo permanece na cama. Muito parado. Mal se houve a respiração. Sinto-me um cadáver de olhos abertos debaixo da terra sem que a cabeça pare nem por um minuto. A mente quer romper, quer tomar conta da minha conduta. Quer-me enlouquecer ou fazer com que entre em contacto com medos que sempre pensei estarem mais do que resolvidos.
Quando me vejo de fora, sinto-me pequeno, encolhido ou insuficiente para o que sei e sinto. Como se uma humildade infantil se apodera-se da minha idade, peso, altura e cor.

Suspiro no silêncio.
Fecho os olhos humedecidos.

Viro o corpo e reclamo o que é meu:

“Quero-te para mim como quem guarda um tesouro precioso para o resto da vida.
Quero ajudar-te sempre. Ser a tua segurança física, o teu braço forte. Não precisas de ter medo nunca mais pois estarei sempre do teu lado. Irei sempre defender-te e lutar por ti. A minha energia vital funciona com o propósito de estar ao teu lado para todo o tipo de situações.
Quero brincar contigo em todo o lado, rir de tudo, levar-te a passear, surpreender-te, conquistar-te, viajarmos muito. Conhecermos e aprendermos em conjunto. Discutirmos muito também é bom.
Quero fazer-te sentir mulher. Ter-te no meu braço, dar-te uma palmada, roubar-te um beijo, meter os dedos nos teus cabelos encaracolados. Fazer amor contigo. Todos os dias, ou sempre que nos apetecer.
Quero tratar-te melhor do que alguém jamais te tratou ou irá tratar, tenho certeza absoluta disto. Não tenhas dúvidas que se não for eu o Teu homem, não sei quem será.
Quero que te sintas à vontade para falar de tudo comigo. Quero ser o teu melhor amigo e não irei tentar usar-te ou enganar-te a meu favor. Não sintas medo de me magoar por algo que possas dizer, prefiro sinceridade a repressão. E tu és um diamante bruto, por isso shine on!
Irei adorar o teu corpo como um templo todos os dias. Não és a única mulher no planeta, mas és a minha e para mim isso não tem preço, é incomparável!
Quero partilhar a minha vida contigo, contar-te o que me vai na cabeça, viver em comum e termos espaços individuais dentro da nossa própria casa. A nossa casa é um refugio para nós mesmos e para quem nos é querido.
O que é meu é teu; gosto que uses o que é meu. Usa o que é meu tal como se fosse teu.
Existe muita coisa que nem preciso dizer-te, tu entendes. Para mim é um descanso. A nossa espiritualidade é uma dádiva, não encontro maneira de conter o emocional no que respeita à minha ligação espiritual contigo, ultrapassa-me e portanto deixa de ser pensado. É puro.
Não pretendo fazer de ti o que não és. Não quero que sejas o que desejo que sejas. Quero que sejas quem és, tal como és. Tal como gosto de ti. Não vais deixar de ser quem és por estares comigo, chamar-te-ei a atenção para isso. Porém, transformações são saudáveis e refrescantes. Transformações são coloridas.
Não pretendo que exista dependência emocional entre nós. Quero que sejas livre e que faças apenas o que desejas fazer sem sentires obrigações, horários ou ressentimentos. Tu sabes o que tens de fazer e quando tens de fazer, não precisas de ninguém que te diga.
Quero que peças favores livremente sabendo que irei responder com o maior dos prazeres e sem exigir nada em retorno. Eu farei o mesmo.

Sente-te plena, livre, confiante, feliz, realizada, amada.

Estarei sempre aqui, mas nunca me tomes como garantido.”

Beijo-te a testa.
Adormeço.