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8/08/2006 

Uma Gota de Ácido

Os corpos idolatravam as colunas como se estas projectassem ondas de esperança, batidas capazes de mudar o mundo ou somente uma alternativa para a podridão de mentalidade em que se vive. Aqui assume-se a podridão alheia e a própria, e festeja-se por ser um rato. Ratos descalços, ratos pulantes, ratos felizes.
E assim, no meio dos corpos sujos fecho os olhos e danço... No escuro criam-se pontos vibratórios que invoco com as mãos e os pés e o movimento do corpo inteiro. Sou um xamã de mim mesmo por breves instantes. O movimento alastra-se e pequenas espirais com as cores do arco-iris rodam acelaradamente num padrão em forma de parede. As ideias começam a aflorar com um tom diferente. Tu olhas, admirada, em teu redor para a decoração que de noite ganha vida como se uma fábrica de sonhos acendesse para todos nós. Falamos, rimos, dançamos, comentamos, as árvores têem vida... Estampo mudanças no teu terçeiro olho. Sentimo-nos únicos e de alguma forma singulares no meio de todos. Estamos na multidão mas não nos fundimos... Viemos sondar terreno, viemos viver mas sem nunca pertencer a lado nenhum. Pairamos por entre a multidão e saimos daquele espaço... Uma Fada marota sorri-nos, diz-nos por onde devemos ir, admiramo-la no escuro da natureza, a sua postura independente confiante e tão sexy. Olhamos para trás, vemos a fábrica de ritmos ao longe, a lua sobre a lagoa, os raios no céu, a aurora borealis como um lençól que abana sobre as estrelas... Parece um parque de diversões noutra galáxia. Falamos rápido, comentamos comportamentos, atitudes, gestos, padrões, mergulhamos num interior admiravelmente vivo no exterior, e tudo se passa rápido, muito rápido... As sensações aumentam, o vortex começa a ganhar forma e nós damos passadas no terreno seguindo a nossa fada como se fossemos a alice a descer a toca do coelho. Tudo é encantado e maravilhoso. Perdemo-nos e encontramo-nos consecutivamente... Rimos, fechamos o olho quântico e pulamos de sensação em sensação, não vale a pena pensar, não dá tempo, demasiada informação para processar, demasiados inputs a serem bombardeados por pequenos tubos plásticos e orgânicos; formigas percorrem a nossa neuro-estructura e bombardeiam cores, sensações e um contacto com o real cada vez menos perceptível.
Quem está aqui connosco e quem está no terreno palpável? Onde estamos nós? Para onde iamos? O que é que nos vai apanhar de seguida?...
Caminhamos, pouco a pouco, e subimos a montanha. Vamos parando, rindo... Tentando parar o quimico que domina tudo e que nos deixa estupefactos com o poder de ilusão e criatividade alegórica. Estamos rodeados de uma névoa gigantesca... Falamos cara-a-cara, olhos nos olhos, tentando focalizar o que dizemos sem que se mergulhe rapidamente no esquecimento, sempre que o fazemos a cabeça gira a mil à hora e o mundo respira sem perdão pelo que tentamos falar... É quase angustiante pois os estimulos são imensos e uma festa inteira roda sobre a nossa esfera enquanto nos esforçamos para trabalhar um com o outro...Fechamos o olho quântico e continuamos. Repetimos este gesto inumeras vezes. A repetição é aliás uma forma de brincadeira com a própria mente. Tem-se a sensação de nada ser fixo ou conforme conhecemos. E as mãos... Deslizam no céu ou em qualquer superfície deixando um arrasto maravilhoso.
Como é possível dois seres tão diferentes experienciarem uma mesma realidade paralela em simultâneo?
Ficamos desorientados, acabamos por nos sentar ao lado da Fada e do Michael numa tenta de projecção mórfica... Vocês vêem vultos de mulheres, eu canso-me e deito-me olhando o interior da tenda de cima para baixo... Fantástico! As extremidades do tecido enrugado que cobrem a tenda mexem-se e dobram-se, vão-se apertando e respirando com vida própria.. A própria tenda inspira e expira... Sinto-me uma criança num playground colectivo. Deliro. Tu deitas-te e vês o mesmo, estamos delirantes, a Fada ri-se e conforta-nos, aproveitamos mais um pouco os sentidos sem deixar que a mente nos assalte por um turbilhão de perguntas terrenas e que procuram grounding.
Combinamos seguir a nossa viagem e encontrarmo-nos no topo da montanha para dormir como espermatozóides que têem um caminho pre-destinado mas que podem ou não alcançar o seu objectivo primordial... Levantamo-nos, continuamos a mergulhar em mini-viagens, mini-filmes, mini-explosões. O vortex aumenta de velocidade e começamos a perder controle do destino e da realidade dominante. De tempos a tempos tomamos um duche de arrepios que testa as capacidades sensoriais. No meu corpo corre uma onda electrizante de destapar e tapar dos ouvidos, foco e desfoco visual, irritação respiratória (pó?). Pisamos terreno alheio... Vemos outras pessoas, conseguimos, aos poucos - talvez muito tempo - subir a montanha e chegar ao topo. Serão todos aqueles seres neste momento parte da nossa realidade mágica? Estarão eles a passar pelo mesmo? Nesta fase a mente vira-se contra nós e ocupa-se maioritariamente em procurar segurança terrena mais do que com o desfrutar daquele estado vibratório. A mente procura grounding, procura equivalente alucinatório ou medidor de realidade. A mente procura estabilidade, ou simplesmente deixou-se apoderar por uma sensação de medo e insegurança estupidificante.
Procuramos conhecidos, procuramos o grupo... Andamos em circulos pela àrea de minhocas moles em colchões azuis... Ficas perturbada, o corpo ressente, vomitas, sentamo-nos, levantamo-nos, andamos mais em círculos... Pensamos em nos separar, mas a viagem é dos dois e nunca te deixaria só num estado tal de vibração e pânico. Vejo uma conhecida, caminhamos até ela... Voltamos a andar em circulos, apercebemo-nos da sobrecarga de estimulos daquela festa e da impossibilidade de encontrar alguém conhecido e confiável. Onde estão todos?... Voltamos a contactar com a conhecida, peço-lhe objectivamente para nos guiar a alguém do grupo. Nesta altura estás quase paranóica. A idiota está demasiado feliz por ali estar e pouco consciente da nossa desorientação assumida. A ajuda é pouca mas acidentalmente afastamo-nos do som e das cores caminhando em direcção à praia. De repente, lembramo-nos da tenda de ajuda, aquela onde os maluquinhos são levados para que com a ajuda de um profissional recuperarem sabe-se lá de que razão... Okay, parece-me bem, a ideia de descer até á praia parece-me uma aventura válida e um descanso para os sentidos, e por hoje posso ser um maluco assumido desde que de alguma forma te sintas mais segura rapidamente. A conhecida fala mas na minha cabeça a única importância é parar aquele vortex descendente. Já chega de brincadeira, queremos paz e terapia. Felizmente estamos juntos.
Chegamos ao maps, deitamo-nos e sais para ir à casa de banho, sem entender porquê sei que ali é onde deveriamos estar, algo me parece certo.. Ouvi dizer que foi uma aventura teres saído aquele instante, e eu que procurava pedir a toda e qualquer pessoa que estivesse contigo enquanto nos separamos.. E enquanto sais para alivio encontro a Ju, ah, alegria, estamos onde deveriamos estar! Rio-me por sermos malucos e aquele ser o nosso verdadeiro spot de encontro! Sinto-me confirmado e que agora é tudo uma questão de tempo. Voltas, descansamos, mais um pouco de paranóia, o cheiro daquele lugar é incomodativo ou há realmente muito pó no ar !? Um espanhol fala comigo e o primeiro contacto com alguém no real é confirmador de uma ilusão gigantesca... Ficamos nisto horas, ou talvez não... Quanto tempo durará? 12 horas? Quanto tempo passou?
Apercebo-me do grau de consciência e de poder mental de cada um de nós, da capacidade de ter os pés no chão, de querer ser/estar ali, de ser conforme se é... Mudo a minha visão de todos nós. Somos muito voláteis.
Acabamos por sair daquele lugar, o dia começa a nascer e passamos a ponte para o outro lado da ilha. A descida pela toca do coelho branco parou definitivamente. Vemos a Vénus a dançar radiante no meio do céu e as cores são maravilhosas! Aquele foi o céu mais bonito que vi em 24 anos. Degradé perfeito de azul para escuro. A natureza estava em paz e ofereceu-nos aquele momento como uma prenda final pela coragem. Tirei uma fotografia mental e atirei-a em todas as direcções, pensei que nunca seria possível imaginar a noite que tivemos. Que aventura!
Passamos a ponte, sinto-me de novo a regressar à normalidade, fico sem palavras. Voltamos para a tenda e falamos, continuo a alucinar e a ver deformações na pele, pelos e textura da tua face...És uma rapoza. Assumimos erros, assumimos medos, partilhamos verdades e dores. Digo-te que o maior medo da minha vida é morrer sozinho e sem ser amado. Nunca tinha pensado em tal coisa mas fez um certo sentido. Deitamo-nos num misto de conformidade e exaustão. Lá fora o mundo continua a girar e os ratos a dançarem. A batida não para.
Fechos olhos, agarro-te no peito e sinto que vivemos vários anos em algumas horas. Esta foi daquelas experiências que vai mudar muita coisa.