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7/21/2006 

Um tipo chamado Noé

No outro dia cruzei-me com um amigo que não via há aproximadamente 10 anos. É uma carrada de tempo e muita coisa aconteceu na minha vida desde então: acabei o curso, fui viver on-my-own, comecei a trabalhar, comprei casa, viajei e casei-me.
O curioso é que tinha pensado no fulano faz pouco tempo, perguntei-me a mim mesmo o que seria feito daquela personagem de nome Noé (não é tanga, o gajo chama-se mesmo Noé e andou comigo na escola).
Estava eu feito pimpão a sair de umas belas compras no Continente e paro em frente a uma loja da Optimus a confirmar o talão com a Re quando olho lá para dentro e vejo o Noé mais alto e homenzinho a atender um velhote que parecia ser habitué da loja.
Lá fui falar com ele muito entusiasmado e perguntei o que era feito da vida dele... Espanto o meu que pouco ou nada mudou. O gajo ainda mora em Belas ou Queluz (para mim é tinto) e trabalha ali naquela loja, tem a sua namoradinha e tal... Trabalha, vai para casa e namora. E ainda se recorda de um amigo que ambos tinhamos em comum, o França.
Fiquei um pouco perturbado com a conversa. Continuei a sorrir de esguia e a desejar-lhe tudo do melhor, mas fiquei com "a pulga atrás da orelha" a questionar-me como é possível que em 10 anos aconteça tanta coisa na minha vida e tão pouca (ou aparente) na dele.
Andei dias a pensar nas escolhas que um gajo faz... No meio em que crescemos, na escola em que andamos, nos amigos que escolhemos, nas opções de estudar ou não estudar, de ir para fora ou ficar, de continuar mais uns anos em casa dos pais ou atirar-mo-nos para o desconhecido. Tomei até consciência que andei numa escola com miúdos que socialmente falando eram de classes baixas ou médias, e que eu provinha de uma família também de classe média. Então o que faz alterar tanto o trajecto que seguimos?
A verdade é que aquilo me pareceu muito como um sinal de aviso. Como se eu devesse fazer uma reavalição da minha vida e estar atento às escolhas que tomo. Não acho que o gajo seja mais ou menos feliz que eu, só acho assustador não existirem mais "novidades" de maior a contar... Como se o acabasse de ver sair da escola naquele instante. Fiquei petrificado com esta ideia. Consegui imaginar o gajo ainda a ir para a escola mas 10 anos mais velho...

E isto leva-me a outro ponto curioso com o qual me tenho andado a debater ultimamente: padrões de comportamento e emocionais adquiridos no meio em que crescemos. Terão uma influência tão grande que não nos apercebemos?
A conclusão a que cheguei no outro dia é que a minha postura perante uma relação em casal é algo doentia e deturpada daquilo que eu realmente quero e escolhi.
Na verdade, o que eu faço é acabar por reproduzir comportamentos que absorvi, de uma maneira ou de outra, da minha família e de quem me rodeava. Ou seja, tomei aquilo como sendo meu, e como sendo a verdade absoluta. E hoje dou comigo a passar por situações em que me pergunto: "onde fui eu buscar esta ideia/comportamento? isto não é meu!"
Onde fui eu buscar a ideia que alguém me pertence? Que tenho de temer o FIM de uma relação? Que sou EU responsável pelas coisas correrem mal ou bem? Que sou eu a razão da satisfação sexual e de libido/atracção existente mutuamente entre duas pessoas?... É de doidos! Isto é tudo padrões dos meus pais, avós, vizinhos, sei lá, meus não são! Isto são merdas que eu vi em filmes ou absorvi em meu redor.
Dou por mim a mexer em báus interiores e a deitar fora coisas que já não interessam e estavam a ocupar espaço útil. Dou por mim a dizer adeus a emoções que reproduzi que nem um robot sem saber por ou como fui programado. E isto é tudo fruto de um gajo ser uma esponja quando é puto!
A minha mãe perdeu a mãe dela era muito pequena, desenvolveu uma relação comigo altamente sufocante e de preciosidade, de algo que ela nunca mais poderia VOLTAR a perder. E eu cresci assim, algo enclausurado naquela fobia. Acabei por repetir esse padrão na minha primeira relação à séria com outra pessoa, com o acrescento dessa pessoa também ser obsessivo-compulsiva e extremamente dependente. Só agora me apercebo disto por estar a ter de conviver com sentimentos opostos. E é este o karma da puta da vida: ter de abrir os olhos ou mudar de opinião, ou pelo menos QUESTIONAR-ME, de ONDE vêem estes fantasmas!?
Não sou nada deste lixo, sou um gajo descontraído, easy-going, que não pisa os calos a quem não pisa os meus, e que procura explorar e ser explorado.. Não sou nenhum controlador invertebrado ou aniquilador de desejos. Pelo contrário, eu sou um gajo até bastante relaxado e que não procura criar confusões num copo de água.
Por isso... Há que dar ESPAÇO para as coisas acontecerem. Há que haver ESPAÇO para ser quem se é, no momento em que nos encontramos...

E é isso que mais certo me distingue do Noé, a capacidade de me re-interpretar e deitar fora as roupas que já não me servem. E se esta relação não servir vai para o lixo. E se este país não for o suficiente, tenta-se outro. E se eu próprio enlouquecer, olha que se foda, rebola-se em colchões de molas partidas, rouba-se mais uns packs de k7s no pingo-doce, parte-se mais umas portas de armário, atira-se mais uns sacos de água pela janela ou afoga-se mais uns ratos em espuma de barbear... Afinal são estas as coisas que ficam com um gajo e que se arrastam com o passar dos tempos!
Foda-se, meto-me em cada uma!